SUMMARY
Este texto pretende investigar casos de morte que envolvam a situação de rua no município de Porto Alegre. Pretende-se tensionar a gestão racional burocrática estatal destes corpos e as consequências políticas, sociais e culturais que a regularidade destes casos põe em evidencia. O foco da análise é a produção da legibilidade estatal, situando a gestão estatal de sepultamentos como o estágio derradeiro do biopoder – a morte, neste sentido, entendida como a expressão e materialização da política do deixar morrer. Propõe-se uma pesquisa etnográfica que, por um lado, (1) situe a morte atrelada, atenuada ou derivada da situacionalidade de rua em uma rede de poder-saber povoada por técnicas estatais, mapeando os registros em documentos que interligam setores e práticas da assistência social, saúde pública, segurança pública, ciência e justiça. E que, por outro lado, (2) acompanhe grupos de pessoas em situação ou com trajetória de rua vinculadas ao movimento social (Movimento Nacional da População de Rua) para refletir sobre uma forma de morrer outra, suas implicações, características e consequências. Passagens que evidenciam a transição do luto à luta, da reivindicação por políticas públicas até o direito ao luto, revelam a gênese de um movimento social que possui como ato fundacional um massacre.