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Gênero e educação da prisão: a pedagogia cultural do Sistema Penitenciário Federal (Gender and education of the prison: the cultural pedagogy of the Federal Penitentiary System)

SUMMARY

e4679029This article aims to analyze the education of the prison in the Federal Penitentiary System. Considering that this type of education involves different aspects, besides schooling, the thematic focus will be based on gender as a social marker of difference. Methodologically, a fictitious transvestite character is used to serve time in a Federal Penitentiary. This federal system is understood as a cultural artifact, therefore, an architectural-legislative institution, with a certain curriculum and cultural pedagogy. From a perspective of post-critical studies in Education, in addition to methodological creativity, we use gender and sexuality studies, as well as national and international legislation, as a reference. The experiences analyzed are related to the result of the interaction of the transvestite with the prison staff. It is concluded that, between constraints and strangeness, the education of the prison occurs through the prosthetic and performative experiences, whether of the transvestite or the prison police. Furthermore, it is verified that the curriculum and cultural pedagogy have made it possible to analyze prison education, especially from its curricular and pedagogical effect with regard to processes of recognition in the specific context of power relations, crossed by norms and conventions of intelligibility, that is, of learning, which are beyond prison.ResumoEste artigo tem como objetivo analisar a educação da prisão no Sistema Penitenciário Federal. Considerando que esse tipo de educação envolve diferentes aspectos, para além da escolarização, o recorte temático se dará a partir do gênero enquanto um marcador social da diferença. Metodologicamente, utiliza-se de uma personagem travesti fictícia que passa a cumprir pena em uma Penitenciária Federal. O referido sistema federal é entendido como um artefato cultural, portanto, uma instituição arquitetônica-legislativa, com um certo currículo e pedagogia cultural. Em uma perspectiva dos estudos pós-críticos em Educação, além da criatividade metodológica, utilizamos como referencial estudos de gênero e sexualidade, assim como legislação nacional e internacional. As experiências analisadas têm relação com o resultado da interação da travesti com os funcionários da penitenciária. Conclui-se que, entre constrangimentos e estranhamentos, a educação da prisão ocorre por meio das experiências protéticas e performáticas, seja da travesti ou da polícia penitenciária. Além disso, constata-se que o currículo e a pedagogia cultural possibilitaram analisar a educação da prisão, especialmente a partir do seu efeito curricular e pedagógico no que se refere a processos de reconhecimento em contextos específicos de relações de poder, cruzados por normas e convenções de inteligibilidade, isto é, de aprendizados, que estão para além da prisão.Palavras-chave: Pedagogia Cultural, Currículo Cultural, Diferença de Gênero.Keywords: Science Curriculum, Gender Discrimination, Prison Education.ReferencesALMEIDA, Guilherme. “‘Homens trans’: Novos Matizes na aquarela das masculinidades?”. Revista Estudos Feministas. Florianópolis. v. 20, n.2, 2012. p. 513-523.AMARAL, Cláudio do Prado. A história da pena de prisão. Jundiaí, SP: Paco Editorial, 2016.ARAÚJO, Stephane Silva de; LEITE, Maria Cecília Lorea. A assistência educacional no Sistema Penitenciário Federal – a Penitenciária Federal em Porto Velho/RO. 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