SUMMARY
Uma forma de tensão reside em todos nós para explicar a origem de uma doença, particularmente entre o discurso médico e os demais discursos (CLAVREUL, 1978). No presente artigo, essa tensão é mostrada por meio da identificação de diferentes vozes numa entrevista de pesquisa em psicopatologia, desvelando-se o modo como a orquestração de vozes por uma entrevistada desempenha a função de argumentação e de produção positiva de si. O artigo apresenta o quadro de análise do discurso empregado, que é um quadro dialógico (VOLOCHINOV, 1977 [1929]), interativo e enunciativo, com forte mobilização da noção de movimento discursivo e interpretativo (FRANÇOIS, 1989; SALAZAR, 2008). Para explicar a origem de seus distúrbios de comportamento alimentar, a “voz pessoal” (assumida no nível da enunciação de forma branda, porém claramente atualizada) da entrevistada entra em tensão com uma voz que revela uma forma de doxa médica; isso altera a assimetria social esperada numa interação entre médico e não médico (MARKOVÀ & FOPPA, 1991). A orquestração desta polifonia pela entrevistada é considerada como o exercício de um papel de reposicionamento social no espaço de suspensão pontual permitido na e pela entrevista. Por fim, os movimentos identificados aparecem como lugares discursivos e sociais